sábado, 10 de abril de 2010

LER E ESCREVER NA ESCOLA: O REAL, O POSSÍVEL E O NECESSÁRIO.

Delia Lerner

Ler e escrever... redefinir o sentido dessa função é uma tarefa incontestável.
Ensinar a ler e escrever é um desafio que transcende amplamente a alfabetização em sentido estrito. O desafio da escola hoje é o de incorporar todos os alunos a cultura do escrito e o de conseguir que todos cheguem a ser leitores e escritores.
O necessário é fazer da escola uma comunidade de leitores que recorrem aos textos buscando resposta para todos os problemas que necessitam resolver, tratando de encontrar informação para compreender melhor algum aspecto do mundo. O necessário é fazer da escola uma comunidade de escritores que produzem seus próprios textos para mostrar suas idéias, para informar sobre fatos que os destinatários necessitam e devem conhecer, enfim, por tantos outros motivos reais e importantes. O necessário e fazer da escola um âmbito onde a leitura e a escrita sejam práticas vivas e vitais, onde ler e escrever sejam instrumentos poderosos que permitem repensar o mundo e reorganizar o próprio pensamento, onde interpretar e produzir textos sejam direitos que é legítimo exercer e responsabilidade que é necessário assumir.
O necessário é, em suma, preservar o sentido do objeto de ensino para o sujeito da aprendizagem, o necessário é preservar na escola o sentido que a leitura e a escrita têm como práticas sociais.
O real é que levar à prática o necessário é uma tarefa difícil para a escola. É por isso que, antes de formular soluções –antes de desdobrar o possível-, é preciso analisar as dificuldades.

-DIFICULDADES ENVOLVIDAS NA ESCOLARIZAÇÃO DAS PRÁTICAS
Ao tentar instaurar as práticas de leitura e escrita na escola, apresentam-se –na realidade- muitas perguntas cujas respostas não são evidentes: o que se aprende quando se ouve o professor lendo? Em que momento as crianças se apropriam da “linguagem dos contos”? como ter acesso às antecipações e inferências que as crianças presumivelmente fazem ao tentar ler um texto por si mesmas? Quando se pode dizer que um aluno aprendeu a recomendar livros ou a confrontar diversas interpretações?...portanto não é simples determinar com exatidão o que, como e quando os sujeitos aprendem essas práticas. Por outro lado, trata-se de práticas sociais que historicamente foram, e de certo modo continuam sendo, patrimônio de certos grupos mais que de outros. Tentar que práticas “aristocráticas” como a leitura e a escrita sejam instauradas na escola supõe, então, enfrentar – e encontrar caminhos a resolver-: a tensão existente na escola entre a tendência à mudança e a tendência à conservação, entre a função explícita de democratizar o conhecimento e a função implícita de reproduzir a ordem social estabelecida.

- TENSÕES ENTRE OS PROPÓSITOS ESCOLARES E EXTRA-ESCOLARES DA LEITURA E DA ESCRITA

Na escola estão em primeiro plano os propósitos didáticos da leitura e da escrita, que são mediatos do ponto de vista dos alunos, porque estão vinculados aos conhecimentos que eles necessitam aprender para utilizá-los em sua vida futura, os propósitos comunicativos-como escrever para manter contato,ler para conhecer outro mundo possível- costumam ser relegados ou, inclusive, excluídos de seu âmbito. Essa divergência pode levar ao paradoxo: se a escola ensina ler e escrever com o único propósito de que os alunos aprendam a fazê-lo, eles não aprenderão a função social da leitura e da escrita, se a escola abandona os propósitos didáticos e assume os da prática social, estará abandonando ao mesmo tempo a sua função ensinante.

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